Um dia somos Totor e no outro já somos Tintim.

Hoje dia 8 de outubro de 2021 é o dia/noite que dediquei para visitar a Exposição Hergé.
Para quem não sabe Portugal foi o primeiro país não Francófono a publicar Tintim e também foi o primeiro país do mundo a publicar o Tintim a cores.
E é com muita alegria que os fãs e os menos fãs recebem de braços abertos a exposição Hergé em Lisboa.
Uma iniciativa do Museu Hergé e que estará patente na Galeria Principal do Edifício Sede da Gulbenkian, esta exposição conta com a curadoria de Ana Vasconcelos e de Nick Rodwell.
Fã confesso que eu sou  de Hergé e coleccionador de todos os seus álbuns, editados pela Editora Difusão Verbo, obviamente que não poderia faltar e capturar algumas fotografias e elaborar este artigo sobre o que eu vi, senti e recordo desta exposição.
Chegado aos Jardins deste belo espaço deparo-me  com o mítico Foguetão ( Explorando a  lua) a convidar os visitantes à fotografia da praxe e nesse mesmo  instante começo a imaginar o título para o meu artigo. "Hergé, Tintim, uma coleção de arte e um foguetão” e STOP.
Quem seria o insensato que acionou o mecanismo de partida mesmo antes de eu começar a visitar a exposição? Regresso à terra novamente, abandono a minha imaginação e deixarei o título para o final, STOP.  
Constato que o recinto da exposição está com um ambiente propício para uma visita digna, contemplativa e envolvente em redor da obra e da pessoa de Hergé, achei deveras interessante que o início da  retrospectiva sobre Hergé começasse pela sua morte, se olharmos para a parede vemos a capa do jornal "Libération" com o desenho da morte de Hergé, simbolizada na  imagem de Tintim caído no chão. , compreendo este fim colocado no início  com sendo uma alusão a um  início sem fim. 
O espaço a luz e a cor é fantástica e a mostra encontra-se dividida em nove núcleos  a "Grandeza da arte menor", "Hergé, o amante de arte", "O romancista da imagem", "O êxito e a tormenta", "Uma família de papel", "Hergé e a revista 'Coeurs Vaillants'", "A arte do reclame", "A lição do Oriente" e "O nascimento de um mito".  Ficará patente até 10 de Janeiro de 2022, pois o dia 10 de Janeiro é o dia em que a personagem Tintim apareceu pela primeira vez no "Petit Vingtième", um suplemento do jornal belga Le Vingtième Siécle no ano de 1929. 
Estão também referenciadas nesta exposição outras personagens menos conhecidas de Hergé tais como Quim e Filipe e também Joana, João e o macaco Simão. Na minha opinião estas personagens são um contraponto à personagem de Tintim.
Achei deveras interessante a presença no local da exposição de vários casais, alguns jovens e outros menos jovens e no modo delicioso de observadores que transpareciam nos seus rostos e diálogos  apreciavam a exposição indiferentes ao click da minha máquina fotográfica .
Hergé  nasceu a 22 de maio de 1907 em  Etterbeek na Bélgica, e inicialmente ele era apenas um miúdo  que só sossegava quando tinha ao seu lado um papel e um lápis.  Soube aproveitar-se e muito bem do seu dom porque foi o seu gosto pelo desenho que fez com que em 1925 surgisse  “As aventuras de Totor” . Uma obra que na opinião de Hergé era para ser simplesmente umas histórias de Escoteiros para serem contadas para Escoteiros. Mas apesar de Totor ser uma personagem corajosa e cheio de recursos  Hergé confessa que de vez em quando inclui a medo um tímido ponto de interrogação ou exclamação para lhe conferir ainda  mais vida e mais dinamismo à personagem e é assim que Totor a pouco e pouco se "metamorfosearia" em Tintim.  
“Tintim no país dos Sovietes” é o primeiro álbum da série ``As aventuras de Tintim. E surgiu fruto de uma encomenda feita a Hergé  pelo abade Norbert Wallez . A ideia do Abade Norbert Wallez era que ele criasse uma história que mostrasse os malefícios do comunismo, bem na linha ideológica de Hergé , simpatizante confesso do fascismo italiano. Como Hergé nunca tinha visitado a Rússia baseou-se na obra, “Moscou sans voiles”, de Joseph Douillet. Dando ao público um retrato completamente errado desse país.Posteriormente na sua obra (Tintim no Congo) Hergé  realça os benefícios do colonialismo Belga enquanto que em (Tintim nos Estados Unidos) ele realça os da civilização Norte-Americana, sendo acusado por muitos como apoiante de uma linha consistente de propaganda conservadora dirigida a públicos infantis.  
No entanto o Abade Gosset  sabendo do interesse de Hergé em desenhar uma história sobre a China apresentou  a Hergé o estudante Chinés Zhang Chongren no ano de 1934, Zhang Chongren  ajudaria Hérge  a escapar das armadilhas dos preconceitos anteriormente demonstrado nas sua obras . Hergé não foi  totalmente correto no modo como expôs em alguns volumes da sua obra a sua visão da sociedade . 
Mas se não fosse Hergé talvez nunca existissem as personagens e as obras de  Asterix, Lucky Luke.  Hergé foi responsável por ter trazido grandeza à banda desenhada que era tratada como sendo uma arte menor, STOP! 
E foi assim através das suas obras  que a personagem Totor transformou-se na nossa conhecida personagem  Tintim.   
Um Tintim  que segundo a opinião do seu criador, Hergé é apenas uma personagem melhorada de Totor.
Não acreditando nas suas palavras, sabemos que Hergé esteve  quase sempre de tal modo envolvido no processo de conferir intensidade máxima ,expressão ou movimento aos seus  desenhos, que desenhava furiosamente com raiva, apagando, emendando, retocando, insistindo, praguejando de modo a conseguir  esboçar uma postura diferente.
Se Hergé não tivesse criado Tintim e se fosse outro o seu criador, talvez a personagem Tintim fosse uma personagem melhor concebida? Ou  uma personagem diferente que ganharia um  cunho completamente diferente daquele que nos cativou? No entanto, deixaria de ser o Tintim que conhecemos e amamos.
Texto e fotografias de Vitor Bom Norte

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